Jorge Lacão (PS): - As eleições autárquicas vieram repor o PS como o maior partido nacional. Se o PSD continua a deter, na Assembleia da República, uma maioria parlamentar, cuja legitimidade institucional se não contesta, é agora bem verdade que perdeu, no País, uma maioria real.
(…)
A vitória do PS reflecte bem, como sublinhou o secretário-geral do meu partido, Jorge Sampaio, que o povo português se interroga, cada vez mais, sobre o sentido da maioria absoluta dada ao PSD em 1987.
(…)
O PSD não pode, pela sua parte, permanecer indiferente à eloquente vontade do eleitorado. A urgência de Cavaco Silva seria a de remodelar o Governo. Até agora, só deu sinais de querer remodelar o povo.
AR, 1989-12-20
Resumo do debate ocorrido na Assembleia da República em 1993-12-15, logo após as eleições autárquicas.
António Guterres (PS): Em vez de aceitar a derrota e felicitar os vencedores, o Primeiro-Ministro preferiu disfarçar o desaire. É mau que o País seja governado por quem não sabe digerir uma derrota.
O PS alcançou todos os objectivos que impôs a si próprio e todos os que os outros lhe foram impondo. O PSD, pelo seu lado, repetiu, no essencial, os resultados de 1989. Ou seja, repetiu um grave desastre eleitoral. Srs. Deputados do PSD, se vos consola repetir um desastre, ficai consolados.
O Primeiro-Ministro não pode deixar de explicar por que é que houve um milhão de portugueses que votaram PSD em 1991 e deixaram de votar PSD em 1993. No mesmo período, o PS aumentava a sua votação em cerca de 400 000 eleitores. O PS transformou-se no primeiro referencial de confiança, de estabilidade e de esperança para o futuro na vida política portuguesa. A instabilidade, agora, mora no PSD.
A abertura deste novo ciclo torna evidente a necessidade da mudança das políticas. Quem, em dois anos, perde a confiança de mais de 1/3 dos seus eleitores tem manifestamente de reconhecer quer aquelas sofreram uma generalizada rejeição. O Primeiro-Ministro não pode deixar de tirar daí as necessárias ilações.
O Governo e o PSD não podem continuar, arrogantemente, a furtar-se ao diálogo com as oposições e com a sociedade. O PS tem evidenciado sempre uma completa disponibilidade, mesmo à custa do seu imediato interesse partidário, para colaborar com o Governo sempre que esteja em causa o interesse nacional.
As eleições do passado domingo estabeleceram entre os portugueses e o PS uma relação de confiança, de confiança para governar, ao nível do poder local, mais de metade da população e a esmagadora maioria dos centros urbanos. É uma confiança que nos estimula para continuar a trabalhar com serena tranquilidade para merecer a mesma confiança para governar o País.
Nunes Liberato (PSD): As eleições autárquicas destinaram-se a eleger os responsáveis autárquicos. Cedo, os adversários políticos do PSD procuraram atribuir um significado nacional a estas eleições. Alguns previram a hecatombe e a humilhação para o PSD. Houve jornais que apresentaram sondagens fabricadas. Outros levantavam a questão da dissolução da Assembleia da República, na sequência das eleições autárquicas.
Não atingimos o nosso objectivo político, mas a oposição também não atingiu o objectivo político de debilitar o PSD. Ao invés, o PSD sente-se reforçado com estes resultados. Os portugueses conhecem a nossa vontade de resolver os problemas, por mais difíceis que eles sejam, e a nossa determinação de prosseguir as reformas de que o nosso País ainda necessita. O PSD, os seus autarcas eleitos, os Deputados, o Primeiro-Ministro e todo o Governo vão, a partir de hoje, continuar a trabalhar por Portugal ainda com mais força e determinação.
Octávio Teixeira (PCP): É visível que o PSD teve uma clara derrota política nas eleições autárquicas, pois nem sequer conseguiu alcançar o objectivo a que se tinha proposto, publicamente reconhecido de fasquia baixa. Na verdade, o PSD até reduz os resultados obtidos [em] 1989, altura em que reconheceu ter tido uma derrota eleitoral. Ora, se houve derrota eleitoral, em 1989, por que é que agora ela não é reconhecida?!
O voto foi claro: 52 % da população portuguesa disse «não» ao Governo, votou contra o Governo e deu origem à segunda maior maioria de votos conjuntos do PS e do PCP desde 1984. Por isso, o Governo saiu derrotado.
Nunes Liberato (PSD): Comparar eleições autárquicas com legislativas é em nosso entender - sempre o dissemos - uma mistificação. Não atingimos o nosso objectivo eleitoral, que era o ambicioso e alto! Não conseguimos atingi-lo! É a pura das verdades! Não queremos mistificar nada!
Ao fazermos um balanço destas eleições, verificamos que todos temos pontos positivos e negativos, até porque se há algo que ressalta delas é a personalização de que foram alvo. E até posso dizer que obtivemos resultados positivos e negativos inesperados. Se os partidos da oposição forem honestos também dirão o mesmo.
Octávio Teixeira (PCP): A derrota eleitoral do PSD é inequívoca. Mas essa derrota é também do Primeiro-Ministro e do Governo, os quais se empenharam de corpo inteiro na campanha eleitoral para tentar evitar a derrota do seu partido.
É justo sublinhar os resultados obtidos pela CDU na Área Metropolitana de Lisboa, onde continuamos a manter a clara maioria na Área Metropolitana e o Presidente da Junta Metropolitana.
As teses sobre o pretenso «esvaziamento do PCP» foram claramente derrotadas nestas eleições. Os positivos resultados eleitorais obtidos reconfirmam o PCP e a CDU como grande força do poder local, indispensável para uma alternativa efectiva ao Governo do PSD e à sua política.
António Lobo Xavier (CDS-PP): As eleições autárquicas decorreram num ambiente de civismo e de tranquilidade. Na verdade, havia algumas explicações para que, ocasionalmente embora, a paz eleitoral pudesse ter sido perturbada. Acaba até por ser surpreendente o judicioso «balanço económico» que, em muitos casos, as populações locais fizeram a propósito de candidatos acusados de irregularidades, apontados como trânsfugas e indicados como exemplos de falta de personalidade. Foram todos seleccionados cuidadosamente, deixando-se passar os úteis e abandonados os inúteis, de uma perspectiva local, mas, o que é mais importante, raramente se transigiu com a corrupção.
Se se deixar de lado a questão formal do cumprimento dos objectivos a que cada partido se propôs, ninguém tem razões para se sentir politicamente deprimido. Mas a questão fundamental é a de que, se ninguém tem razão para ter uma depressão política pós-eleitoral, ninguém poderá também encontrar causas para grandes exaltações. A verdade é que os resultados destas eleições não traduzem um profundo rearranjo das forças políticas. É provável, portanto, que, em termos gerais, a tentativa de nacionalizar as eleições locais tenha falhado, ao menos parcialmente.
Estas eleições trouxeram também duas lições e, curiosamente, ambas em Lisboa. Uma lição de dignidade e de responsabilidade política na assunção dos resultados, uma lição de urbanidade e de civismo democrático, protagonizada pelo vencedor em Lisboa e, ao mesmo tempo, uma lição de indignidade, de falta de carácter e de fair play e de saber perder em democracia, vinda, curiosamente, do candidato derrotado. É bom que também estas lições aproveitem ao País!
"O PSD teve um resultado nestas eleições [autárquicas] que só não é hoje reconhecido como uma hecatombe porque se iguala ao que há quatro anos foi interpretado como tal. É a única razão. Se há quatro anos os senhores não tivessem tido uma hecatombe, hoje, todos diriam que a tiveram; registaram duas hecatombes e ficam muito satisfeitos por esse facto. Mas é óptimo para o PS que o PSD fique satisfeito quando repete derrotas destas; o PS nunca fica satisfeito com as suas derrotas e lutará sempre por transformá-las em vitórias. Gostam de ser derrotados? Excelente! Continuem assim que dão um óptimo contributo às nossas vitórias!"
António Guterres, 1993-12-15
Eis a lista das dez eleições mais renhidas para a câmara municipal:
(Nota: MA - Maioria Absoluta)
10. Castelo de Paiva: O PSD manteve a câmara (MA) por 63 votos;
9. Alfândega da Fé: o PSD manteve a câmara por 57 votos;
8. Monforte: a CDU manteve a câmara (MA) por 49 votos;
7. Sabrosa: uma lista independente ganhou a câmara por 39 votos;
6. Mondim de Basto: o PSD manteve a câmara (MA) por 31 votos;
5. Vila Nova de Foz Côa: o PS ganhou a câmara (MA) por 29 votos;
4. Mourão: o PS manteve a câmara (MA) por 23 votos;
3. Lage das Flores: o PSD manteve a câmara (MA) por 16 votos;
2. Alter do Chão: a coligação PSD-CDS manteve a câmara por 10 votos;
1. Manteigas: o PSD manteve a câmara (MA) por 1 voto!
Comentários:
1. Apesar de estas terem sido as dez câmaras municipais onde a disputa foi mais renhida, nenhuma delas mereceu especial atenção pelos media, nem durante a campanha nem na noite eleitoral.
2. A esta lista poderia ter acrescentado mais algumas dezenas de câmaras onde a vitória foi assegurada por poucas dezenas ou centenas de votos (ex.: Estremoz - 73, Almeida - 90, Sesimbra - 102). Também nenhuma delas foi alvo de especial atenção pelos media nacionais.
3. Estes resultados permitem desmentir aqueles que acham que o seu voto não conta. O caso de Manteigas é paradigmático: um simples voto permitiu a conquista da câmara e a eleição de mais um vereador.
Lembre-se disto da próxima vez que (não) for votar.
Suponhamos o seguinte:
Será que o treinador do PS diria: "O resultado não foi assim tão mau. No fundo, repetimos o resultado de há quatro anos, esse sim muito negativo. Não precisamos de mudar de plantel nem de rever o nosso sistema de jogo. Está fora de hipótese uma chicotada psicológica"?
Ou será que diria: "Mais uma vez, não conseguimos ganhar. Mais uma vez, saímos humilhados de campo. O resultado foi muito pesado, mas, a meu ver, não reflecte a diferença de qualidade entre as equipas. A verdade é que o nosso adversário jogou bem, e para além disso soube aproveitar os nossos deslizes. Precisamos de rever o nosso sistema de jogo. Precisamos também de entrosar melhor os nossos jogadores, para não voltarmos a cometer certos erros que se revelaram fatais. É possível que venhamos a contratar um ou dois reforços. Creio, apesar de tudo, que tenho condições para continuar a comandar a equipa técnica, embora reconheça que a carreira de um treinador depende sobretudo dos resultados"?
O dogma da infalibilidade é um dos dogmas mais conhecidos da Igreja Católica. A discussão de um determinado assunto é bem-vinda no seio da Igreja, só que, uma vez tomada uma decisão pelo Papa, esta tem que ser tomada como boa e não pode ser questionada.
Se substituirmos o Papa pelo povo, podemos dizer que este dogma também se aplica às democracias. Podemos até considerá-lo um postulado de qualquer regime democrático: quando se pronuncia através do voto, o povo nunca se engana. Quanto muito, poderá ser enganado.
Vem isto a propósito das próximas eleições autárquicas. Estamos perante a possibilidade de vários candidatos, tratados na praça pública como criminosos, poderem ganhar as eleições. Perante este cenário, levantam-se já muitas vozes dispostas a passar um atestado de menoridade aos eleitores: como é possível elegerem alguém deste jaez?
Só que, se em democracia o povo é soberano, então insultá-lo pelas suas decisões é um crime de lesa-majestade. A pergunta terá que ser outra:
Sabendo o povo o que sabe, porque não escolheu um dos outros candidatos? Que raio de candidatos é que os partidos andam a apresentar para que o povo os pretira por um escroque?
Ver um candidato (tratado como) criminoso ganhar as eleições será uma enorme humilhação. Não para o povo, mas para os candidatos (e partidos) perdedores.
Manuel Maria Carrilho apresentou ontem alguns pontos do seu programa eleitoral para Lisboa.
Prometeu, entre outras coisas, diminuir o trânsito, aumentar o número de parques de estacionamento, dinamizar os transportes públicos e combater a insegurança. Nada de novo nem de muito específico. Apenas o pacote básico da demagogia eleitoral autárquica.
A ideia mais original foi a de construir oito praças em vários bairros da cidade. Já agora, com um coreto e com uma banda filarmónica em cada uma delas. O problema desta proposta tão esdrúxula é não se preocupar com as minudências próprias da realidade: onde ficam as tais praças, quanto custam e quem paga a banda.
Pelo pacote apresentado, Carrilho corre o risco de ser confundido com um garoto de programa. É que o seu programa parece ter a mesma credibilidade da ocupação sua homónima...
Nos casos mais polémicos, Marques Mendes tem feito escolhas razoáveis para as próximas autárquicas, mas tem falhado redondamente na sua justificação.
Marques Mendes tem apresentado dois argumentos, quase leis, para aplicar às escolhas do seu partido: a continuidade dos presidentes em funções e a inexistência de suspeitas relativamente aos candidatos.
Marques Mendes recusou Isaltino Morais para Oeiras, justificando-se com a situação ainda mal esclarecida das contas na Suíça. Mas recusou Santana Lopes para Lisboa, apesar deste ser o presidente em funções. Qual será a escolha para Gondomar?
Se Marques Mendes apoiar Valentim Loureiro, estará a violar a regra aplicada a Isaltino Morais (com a agravante deste último nunca ter estado a contas com os tribunais). Se lhe recusar o apoio, estará a ir contra a regra da continuidade dos presidentes em funções.
Marques Mendes não se deve preocupar em justificar excessivamente as suas escolhas. Basta-lhe dizer que fulano é candidato porque conta com a sua confiança, e que sicrano não o é porque achou que outrem estava em melhores condições. Afinal, Marques Mendes é o líder do partido, e é seu privilégio escolher ou vetar quem bem entenda.
Ao esconder-se atrás de regras gerais que só valem para alguns casos está a dar um sinal de fraqueza, bem como a demonstrar a sua incapacidade de chamar os bois pelos nomes.
. cesaredama@sapo.pt
. Ali Babá
. Oeiras - Lisboa - Gondoma...
. BLOGUES:
. Abrupto
. Cognosco
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. OUTROS:
. INE
. Pordata
. YouTube
. BLOGUES:
. Abrupto
. Cognosco
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. OUTROS:
. INE
. Pordata
. YouTube